domingo, 21 de junho de 2015

Experiência do dia 02 de junho, Campo Grande, e Relato de Experiência


Um começo...

Alguns dias atrás, no dia 02 de junho, o espetáculo performático Cidade Cega realizou a primeira experiência com os alunos da turma da professora Lilith Marques, na disciplina Dicção I, da Universidade Federal da Bahia. Esse encontro instaurou uma relação de confiança e de desejo entre as pessoas que aceitaram participar desta vivência de andar com os olhos vendados. Sentir? Refletir? Pensar? Questionar?

Talvez sejam essas as perguntas/palavras para tentarmos expressar uma noção de Cidade. De nos sentirmos como parte deste fenômeno da urbanização. Quantas cidades desiguais, os perigos, as responsabilidades, os desafios, mas, também, um lugar do encontro, do inusitado, dos seres. A via maior desse projeto é buscar um meio de fazer que percebamos que a cidade é uma conjugação plural.

Apesar dos inúmeros singulares que existem pela urbe, a cidade é sem dúvida, um efeito de um coletivo, de sujeitos e estruturas que compõem esse labirinto urbano. Abaixo os relatos das pessoas que participaram e se entregaram à experiência urbana, cujo objetivo é experimentar. A razão está no sentir os objetos, mas também a si próprio; reflexão através da experiência do agora; resposta de um questionamento da ação, pois pensar sobre, torna-se um elemento de algo acontecido.

Enfim, essas vivências são aperitivos de algo que estamos preparando para julho.


Relato de Experiência:

Relato 1:

Cidade Cega, um bom nome para nomear uma das percepções que tive ao viver o experimento com os atores cegos do elenco do projeto “Cidade Cega” no dia 02 de junho. Eu e mais seis pessoas vendadas, fui conduzida por um homem cego, Gilson, pelas ruas do Campo Grande e Canela, em Salvador. Não faço ideia de quanto tempo durou a experiência. Tempo e espaço foram dimensões que se diluíram, ou melhor, se transformaram na minha percepção da experiência sensível; perdi noções rotineiras de tempo-espaço, para ganhar outras. Percebi que sou cega para um monte de outras formas de experienciar a cidade de Salvador, como o contato com o piso, por exemplo. Os sons e cheiros, o ar... a percepção da umidade do ar! Nossa foi como se estivesse pela primeira vez vivendo a experiência de caminhar na rua. Contudo também refleti muito sobre as condições dos cegos, como nossa cidade de Salvador está mal preparada para receber os deficientes visuais. Tive ainda uma experiência incomun, quando uma pessoa da produção se juntou à fila que eu estava e começou a imitar uma pessoa da rua. Pensei mil coisas, que era um mendigo bêbado ou que era um adolescente tentando tirar sarro de nós. Percebi então como (na rua) as relações humanas são jogadas às escuras ao estabelecer um vinculo imediato de confiança com o outro; contudo, nós que enxergamos temos ao menos a imagem física, visual, de nosso interlocutor para avaliar se confiamos ou não nele, o cego (na rua), não tem nada mais do que a voz e a informação que a pessoa está passando sobre ela mesma; ou seja, para o cego, relacionar-se no âmbito público com estranhos é um grande ato de confiança no ser humano. Me impressionou muito isso. Cidade Cega é uma proposta artística revolucionária no mundo dos sentidos, cada um precisa vive-la para tirar as próprias conclusões!

Lilith Marques, professora da UFBA, atriz do Grupo Panacéias Delirantes

Relato 2:

Nunca tinha visto a cidade do jeito que vi estando 'cega'. Não imaginava como o barulho dos carros poderia ser aterrorizante, quando não se pode ver para onde eles estão indo. Nunca pensei que descer um passeio para atravessar uma rua pudesse ser como cair de um abismo em direção ao desconhecido. Mas a segurança e a suavidade das palavras da nossa condutora Cristina me deram mais confiança para continuar a caminhada até o Campo Grande. Tudo era novo e, em minha mente, eu estava criando
os caminhos por onde passava. Foi muito revelador ser conduzida por uma cega, desconstruir muitos conceitos equivocados sobre como eles deveriam se sentir na rua sozinhos. O mais emocionante foi quando, no final do trajeto, sentados no banco da praça, ouvimos as palavras de Cristina: 'Abram os olhos, vocês deixaram de ser cegos'. Foi como um renascimento para a forma como eu vejo e vivencio o mundo ao meu redor. Inesquecível!


Siomara Coelho, aluna da UFBA.

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